quinta-feira, agosto 29, 2024




                                                          " Terras de Mogadouro "



A Última Ceia 

Trouxe as palavras e colocou-as sobre a mesa. 
Trouxe-as dentro das mãos fechadas (alguns disseram 
que apenas escondia as feridas do silêncio). 
Pousou-as na mesa e começou a abri-las devagar, 
tão devagar como passa o tempo quando o tempo 
não passa. E depois distribuiu-as pelos outros, 
multiplicou-se em dedos, em palavras (alguém disse 
que chegariam a todos, ultrapassariam os séculos e 
teriam a duração do tempo quando o tempo perdura). 
Ceou com todos pão que não levedara e vinho áspero 
das videiras magras do monte que os ventos dizimavam. 
Quando se ergueu, havia ainda palavras sobre a mesa, 
coisas por dizer no resto do pão que alguém deixara, 
feridas fundas nas mãos que fechou em silêncio e devagar. 

Perto dali uma figueira florescia. 
 À espera.

 Maria do Rosário Pedreira



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