domingo, março 21, 2021

poesia





A poesia de uma mãe que grita na varanda
chamando os filhos para a mesa.
A poesia de um rádio que toca do outro lado
de uma janela entreaberta.
A poesia de um mendigo curvado à frente de um chapéu
no passeio á espera de esmola.
A poesia de um charco quase seco entre pedras.
A poesia de um cão que se espreguiça
bocejando numa esteira.
A poesia de um televisor silenciado
enquanto se ouve música.
A poesia de uma rua a meio da tarde
em cujo extremo há uma fresta de luz que se projecta
sobre o mar, atravessada pelos tombos de um bêbado.
A poesia de uma voz ao telefone
A poesia de um autocarro que sobe a avenida
cheio de gente ensimesmada.
A poesia de uma mancha de óleo na calçada.
A poesia de umas mãos que quase não são as minhas.

Toda esta poesia que nunca cabe num poema.

Roger Wolfe



Sem comentários:

Enviar um comentário